O VELOCÍPEDE, A LÁSSIE E EU
Meu velocípede era infernal.
Com ele fazia curvas, derrapando
do infantil para o maduro.
Do sonho para a realidade.
De cada esquina, na vila de Anta,
naquelas calçadas escorregadiças,
alçava vôos mais longínquos,
deslizando para a idade adulta.
Comigo vinha o cheiro, o sabor
do lugar, com um corpo pequenino,
na garupa, meu primeiro amor,
minha cadelinha amante, Lássie.
Negra, toda peluda, trêmula...
Quem jamais esqueci e só por
isso visita meus sonhos, lambendo
minhas costas, o rosto, o pescoço,
sôfrega, com medo de cair.
Nunca a deixei cair, nem em sonhos.
Sempre terminávamos a aventura rindo.
Depois levaríamos o velocípede pra casa.
Ele sabia que seria bem guardado.
E no amanhã voltaríamos a escorregar,
os três, pelas calçadas de Anta.
Até hoje deslizamos os três nos meus sonhos.
O velocípede, a Lássie e eu.